Sem celular nas escolas: docentes contam seus pontos de vista

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Nova lei entreou em vigor em fevereiro deste ano, e proíbe o celular na instituições de ensino do nível básico públicas e privadas.

Aprovada recentamente, a Lei 15.100/2025 mudou o dia-a-dia das instituições de ensino em todo o país. Isso porque a legislação restringe o uso de celulares em ambientes escolares nos ensinos fundamental e médio, proibindo seu uso mesmo em momentos em que não há aula, como recreios e intervalos. Amplamente defendida por educadores e muitos responsáveis, a lei teve amplo apoio no Congresso e foi sancionada no dia 19 de fevereiro pelo Executivo.

O objetivo principal da norma é garantir que as escolas tenham sua função de espaço destinado a aprendizagem e sociabilidade resguardados, fazendo com que as crianças e adolescentes não sejam prejudicados no processo educativo. Além disso, também busca-se cooperar no sentindo de evitar os riscos dos vícios de uso de telas e redes sociais nos estudantes.

Recebida com louvor por grande parte da comunidade de docentes e responsáveis, a legislação está em período de adaptação, com os estudantes sendo os mais resistentes a se adequar às novas diretrizes. Mas o que não faltam são relatos de professores sobre a diferença já notada no ambiente escolar, com alunos mais focados e com maior socialização. Mas há quem tenha pontos de discordância sobre a lei.

É importante enteder também que a legislação determina que os regimentos internos das escolas devem traçar determinantes sobre como armazenar os aparelhos, e prever punições a quem desrespeite a regra. També se prevê exceções para estuantes que dependem do aparelho móvil por questão de acessbilidade ou saúde, desde que comprovados por laudo médico.

Um outro ponto importante da legislação diz respeito aos professores, que devem ser orientados e capacitados para inclusão tecnológica no processo educativo, e também para se manterem atentos quanto a eventuais prejuízos dos aparelhos digitais na saúde dos estudantes.

Embora a nova legislação não inclua o ensino superior, o projeto é acompanhado de perto por educadores e especialistas de todos os níveis da Educação, já que pode servir como exemplo de como os aparelhos móveis e a tecnologia como um todo interferem nos projetos pedagógicos e instituições de ensino.

Pensando na relevância dessa paauta para a Educação, conversamos com três docentes do Ecossistema BRAS Educacional para entender seus pontos de vistas sobre a nova lei – alguns inclusive com atuação na Educação Básica.

Foco na intencionalidade pedagógica

Para além do uso do celular, o docente e pedagogo da UniBRAS Digital Rafael Moreira – que também é docente na educação básica – explica que a lei não tem qualquer motivação em retirar a tecnologia das escolas, mas foi pensada justamente na reeducação do seu uso. Isso porque não só toda a sociedade é cada vez mais tecnológica, como a tecnologia, quando bem aplicada, é uma aliada no processo de aprendizagem.

“Hoje o telefone é muito mais que uma ligação, ele pode se transformar numa sala de aula estendida, e também é um recurso que pode ser ampliado para que as coisas aconteçam. Só que é importante entendermos que a lei vai além, e permiteo o uso dos recursos tecnológicos de modo que as coisas fluam o aprendizado e a troca de saberes. O problema é o que a não intencionalidade pedagógica gerou”, argumenta.

Ele explica que a escola em que trabalha está bem equipada com dispositivos tecnológicos com acesso a internet nos laboratórios de informática, e também com outros ambientes de capacidade intelectual sem acesso virtual que compoem satisfatoriamente o ensino desses alunos, como a biblioteca e salas de laboratórios. O uso do celular, quando necessário, é avisado aos pais com antecedência.

Mas como o celular em si não é um vilão, e sim o seu mau uso, Rafael explica que há exceções. Como a própria legislação aponta, há alunos com deficiência que pecisam do celular para aplicativos de inclusão. Além disso, estudantes dos anos mais avançados já tem a autonomia de levar o aparelho móvil para notificar os pais de sua chegada ou chamar um carro por aplicativo como transporte até a escola, desde que os mantenham desligados ao entrar na instituição.

Apesar de apontar que na escola em que atua o celular já era proibido, ele explica que antes os alunos tinham permissão para manuseá-lo nos horários livres, algo que com alei se tornou bem mais restrito. Com a implementação da legislação, o educador entendeu que houve um forte avanço para a comunidade escolar e também a familiar, e que apesar de alguns resistentes, aos pouco as coisas se adaptam.

“A gente entendeu que houve um ganho. Um ganho social, um ganho de diálogo, de interação e descobertas. Um ganho que o aluno entendeu que a escola tem que resgatar suas funções, e que ela também tem a função tecnológica, mas que não no tempo do aluno. As rodas literárias, de conversas, os debates, trabalhos manuais, todos estão sendo retomados e intensificados. E claro, o protragonismo do próprio aluno, no qual ele fala, não copia, não traz um discurso pronto”.

Melhor alternativa possível

O professor do Centro Universitário UniFACTHUS, Roberto Campos, explica que há uma certa unanimidade enre os professores sobre os benefícios da nova lei – algo que segundo ele já é fortemente percebido nas redes de educadores. Segundo o docente, quando o aluno está imerso em notificações, redes sociais ou jogos, o processo de absorção e relexão dos conteúdos lecionados é comprometido.

“A presença constante dos celulares tem contribuído para uma fragmentação da atenção e uma diminuição do engajamento durante as aulas. Essa dispersão interfere diretamente no processo cognitivo, elemento central para o desenvolvimento e a excelência acadêmica, que é o verdadeiro serviço ao qual as escolas se destinam”.

Roberto explica que existe um contraponto de muitos envolvidos no processo educativo argumentando sobre a utilidade no celular no processo de aprendizagem, mas segundo ele isso não deve se derivar num afrouxamento da legislação, como a possibilidade mais branda de deixar os alunos terem um acesso “controlado” aos dispositivos dentro da escola, já que esse monitoramento é muito complicado.

“Para que se aproveite de forma efetiva o potencial pedagógico dos celulares, seu uso precisar ser limitado a momentos restritos e sob orientação direta dos professores. Na prática, a ausência de normas que autorizem a apreensão dos dispositivos acaba impedindo que os educadores possam confiscar os aparelhos, dificultando o controle”, justifica.

Ele também explica que para transformar o smartphone em um recurso educativo, seria fundamental que as escolas adotassem estratégias como a elaboração de regimentos internos claros, a capacitação de professores para manejarem esses recursos, e principalmente a implementação de medidas disciplinares quando necessárias – medidas que não contam com o apoio majoritário dos responsáveis.

“Nessas condições, vejo a lei como uma resposta necessária, porque mesmo o aprelho celular tendo potêncial como ferramenta educativa, a realidade é que sem o devido controle os prejuízos se sobrepõem aos benefícios. A medida visa preservar o ambiente escolar e fomentar o desenvolvimeto integral dos estudantes”.

Foco na devida interpretação

O pedagogo e docente do Centro Universitário UniFACTHUS, Bruno Pereira, concorda que a lei é muito bem-vinda. Para ele, além da medida evitar que o aluno se disperse – o que dificulta tanto a sua aprendizagem quanto o andamento das aulas, também ajuda nos casos de vício em telas, já demonstrado por estudos. No entanto, ele chama a atenção para a interpretação que as instituições de ensino e os gestores escolares estão fazendo, porque o celular também pode ser um aliado nos estudos.

“É fundamental reconhecer que os dispositivos eletrônicos podem ser também uma excelente ferramenta pedagógica. Então na verdade é preciso analisar em quais

momentos utilizá-los, e qual sua intencionalidade. Há atividades em que os celulares enriquecem as aulas, como aplicativos educativos, gravação de vídeos, pesquisas orientadas e mesmo atividades que envolvem música”, argumenta.

Para ele, a chave está em entender quando é positiva a presença dos aparelhos em sala de aula, e quando não é, e não restringí-lo de maneira absoluta. De acordo com o especialista, desde a implementação da lei, muitos têm interepretado a regra de forma rígida e errônea, já que a legislação faz alusão ao uso inadequado dos celulares, e não sua exclusão completa do ambiente escolar.

“Há casos de gestores que estão fazendo uma interpretação equivocada da norma, proibindo completamente o uso dos celulares em sala de aula, inclusive pelos próprios docentes para fins pedagógicos. De acordo com a secretaria de educação aqui da cidade, se algum professor quiser fazer qualquer registro com fotos ou vídeos de suas atividades, ele tem primeiro que pedir autorização para o gestor da escola”.

Para o pedagogo, restringir o uso total dos celulares não é o caminho correto para evolução do uso das ferramentas tecnológicas, e sim a adoção de uma interpretação mais compreensível da norma, em que os celulares sejam devidamente incluídos em sala de aula, desde que tenham uma intencionalidade pedagógica clara. (Texto: Bruno Corrêa – Assessoria de Comunicação Ecossistema BRAS Educacional)